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terça-feira, 4 de maio de 2021

Artigo- Exame de Propostas Reformistas da Constituição

Artigo do Desembargador Marco Aurélio Costa Moreira de Oliveira - Membro do Conselho Superior do IARGS e ex-presidente do TRE
Tema: Exame de Propostas Reformistas da Constituição
 
Li, recentemente, mais um excelente artigo de pessoa dedicada a exames de ideias e projeções sobre sociedade. Desta vez, referia-se a uma manifestação de conhecido advogado e professor universitário de outro estado. O catedrático fazia propostas destinadas às emendas de nossa Constituição, todas bem articuladas, mas que me levaram a examiná-las com muito vagar. Em que pese a manifestação do ilustre professor, entendo fazer rápidas observações, ponto por ponto, como seguem.

Em primeiro lugar cumpre salientar que, dentre as pretensões reformistas trazidas pelo culto proponente, algumas delas já haviam sido manifestadas por outros estudiosos do tema. No entanto, foram por ele bem examinadas e aprofundadas.

Por outro lado, não seria de se admitir a proposta, feita pelo ilustre advogado e professor, destinada a serem também elegíveis políticos independentemente de filiação partidária, isto é, sem vinculações a regras estatutárias e a programas ideológicos. A consequência quanto à atuação desses políticos no exercício dos mandatos obtidos, seria a de completa impossibilidade de a eles se aplicarem punições, em nome de partido político, por condutas incompatíveis com a ordem social e atentatórias aos princípios constitucionais. De outra parte, os filiados, mas não os avulsos, poderiam sofrer sanções internas e até decisões de desfiliação por ideias incompatíveis com as normas vigentes. Essa diferença de tratamentos demonstra a inaceitabilidade da proposta em favor de políticos sem filiação.

A seguir, dentro da manifestação reformista, destaca-se a proposta de introdução do voto distrital em nosso sistema eleitoral. Essa inovação, todavia, somente se entenderá adequada se trouxer a denominação “distrital mista”. Ou seja, em cada um dos vários distritos, estabelecidos previamente pela legislação, somente poderão concorrer os nele residentes. De outra parte, deve-se prever a existência de vagas em âmbito estadual, em que viessem a concorrer candidatos de liderança mais acentuada em seu partido político e que se destinassem a colaborar para uma representação popular mais generalizada.

Outra proposta, apresentada pelo ilustre professor, esta digna de aceitação, reside no fim ou na extinção do foro privilegiado por prerrogativa de função, finalização essa que vai ao encontro da opinião da maioria dos estudiosos e dos cidadãos em geral, e até mesmo de inúmeros membros do Poder Judiciário. Com a extinção do foro por prerrogativa de função, serão evitados incontáveis processos em relação a titulares de uma multiplicidade de cargos, em verdadeiros acúmulos de feitos nos tribunais, denominados de dilações processuais, ou na inteligente frase do Ministro Marco Aurélio Mello “questões que passariam por seu estágio nas prateleiras”. Até mesmo, inúmeros casos de prescrição seriam evitados. Entende-se, no entanto, de ressalvar os casos de acusações criminais contra o Presidente e o Vice-Presidente da República, e os Governadores de Estados, pois deveriam ser julgados por Tribunais superiores, como o Supremo e o STJ .

Descabe, data vênia, a proposta por voto facultativo, tendo em vista que, com a aceitação da facultatuvidade, se poderia comprar a ausências de eleitores para não exercitarem o direito ao sufrágio. Com a atual obrigatoriedade, não há como se subsidiarem eleitores para não votar, pois todos devem cumprir sua obrigação cívica, sob pena de incidirem em possíveis perdas de determinados direitos. Sendo o voto obrigatório e secreto, não há como se comprar o eleitor, pois impossível fiscalizar em quem ele realmente votou. No sufrágio facultativo, basta a compra de ausências, principalmente de pessoas de classe pobre ou subordinados, para impedir votos em favor de políticos contrários às pretensões e interesses de poderosos.

Mas há, ainda, um ponto mais importante da proposta a se afastar. Ou seja, o denominado mandato “pro tempore” (8 ou 10 anos) no Supremo Tribunal e nos tribunais superiores. Com essa fixação, certa, os ministros sabem concretamente do término de seu poder jurisdicional e, então, se despedem da Corte... Antes disso, em sua atuação, puderam se preparar para futuras atuações privadas e até para suas atividades de pareceristas. Poderiam, então, afeiçoar votos e fundamentos a uma futura, mas preparada atuação profissional. Melhor mesmo é a vitaliciedade em vigor, principalmente no Supremo Tribunal, quando os ministros se sabem intocáveis por longo tempo, isto é, enquanto permanecerem julgando. É comum que, ao sentirem a proximidade etária da aposentação, não se sujeitem a situações inconfessáveis. Ao contrário, esmeram-se na elaboração de votos similares a um “canto de cisne”, para ficarem lembrados para sempre, como foi o caso de vários ministros que assim atuaram em nome de sua permanência histórica na memória de futuros julgamentos e da jurisprudência.

Por outro lado, merece ser mantida a atual fórmula de o ministro chegar ao Supremo, sem dúvida, ainda pelo critério atual, menos prejudicial para o Poder Judiciário. Quem indica o ministro é o Presidente, eleito pela Nação, fato que o torna responsável perante ela. Daí, o cuidado que deve ter na escolha do futuros ministros. Vejam-se os casos de presidentes afastados do cargo e que não contaram com apoios vindos de seus eleitores por decidirem contra o consenso geral. Da mesma forma funciona a escolha equivocada de ministros pela qual também responsáveis. Por outro lado, escolherem-se, como pretendido, magistrados dentre os mais antigos na carreira nem sempre representa a melhor solução. Muitos poderão pretender usar o conceito de experientes para se posicionarem em superioridade a outros para fazerem valer suas atuações passadas em outra jurisdição.

Por tudo isso, entende-se que o pensamento mais adequado é o que propugna em favor da atual Constituição tal qual existe, elaborada que foi por representantes do povo e não apenas por eruditos. Aliás, mais facilmente se esquecem os eruditos do que pessoas comuns portadoras de bom senso. Assim, a elaboração legislativa deve ser mantida como está, com seus erros e suas virtudes, pois é ela que deve ser cumprida em nossa democracia em favor da segurança jurídica e de seus princípios humanistas; ressalvadas pequenas corrigendas impostas pelos novos tempos, segundo o permissivo de emendas necessárias.

Além disso, críticos sempre têm referido descompassos de decisões do Supremo com a população em geral. Ora, essas divergências servem mesmo para indicar novos rumos em orientações jurisdicionais, como ocorreu nos casos da homoafetividade. O bom julgador é o que sabe se adequar a novas concepções sociais quando justas. A mídia também participa com críticas saudáveis e construtivas de novas ideias. Mas o que se entende desejável é que a Constituição tenha sido sufragada pelos representantes do povo, como aconteceu, mesmo com erros e acertos, e não por intelectuais ou eruditos fora da vivência social. Não se pode prescindir, todavia, dos estudiosos e dos sábios, em suas atuações sociais, pois a eles cabe orientar as instituições com seus conhecimentos, suas lições e seus pensamentos. A eles cabe participar também dos parlamentos para iluminá-los com suas ideias, trazidas das cátedras e das universidades. Aos juristas cabe fazer suas propostas para serem bem examinadas pelos cidadãos legisladores, dando contribuições em eventuais contraditórios. Pareceristas devem se manifestar para ampliar os debates em torno de propostas, bem como para rebater ou acolher manifestações como, por exemplo, as produzidas nesta exposição de pontos de vista, por serem suscetíveis de críticas.

Finalmente, aqui, se está para acolher sugestões até mesmo as de alterarem conceitos e propostas oferecidos aos que vierem a ler esta comunicação. Da contrariedade nascem novas concepções. E que as alterações a serem eventualmente legisladas sejam examinadas pelos congressistas eleitos dentre a cidadania, segundo a ordem democrática em que vivemos e que está a se cristalizar.

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