Artigo do Desembargador Marco Aurélio Costa Moreira de Oliveira,
Autor de Justiça e Ética – Ensaios sobre o uso das Togas
Membro do Conselho Superior do IARGS
Tema: O júri e sua importância
No desempenho da promotoria, da magistratura, da advocacia e do magistério jurídico, muitas vezes fui questionado sobre a importância do júri com competência para julgar crimes dolosos contra a vida. E ao questionarem, levantavam objeções sobre a validade do júri, entendendo essa instituição jurídico-processual como se fosse apenas um verdadeiro teatro. Nele, dizem, a melhor performance de oradores leva o conselho de sentença a optar por teses nem sempre jurídicas. Por outro lado, grandes juristas e excelentes processualistas criminais também participam do mesmo entendimento que serve de contestação contra essa instituição. Em minha experiência, ao atuar em tantos segmentos jurídicos e em tantos lugares de nosso país, sempre encontrei colegas ilustres promotores, juízes de elevado coturno, além de advogados de nomeada e respeitáveis professores de direito penal, apoiadores do júri como verdadeiro pulmão da democracia.
Ora, todos os favoráveis ao júri entendem não ser a melhor performance nos debates que leva o tribunal popular consagrar alguma das teses defendidas e sim a convicção que cada jurado sentir sobre o todo que lhe é levado a decidir, quanto à sua inocência ou culpabilidade. Para bem analisar uma instituição jurídica, deve-se percorrer sua história e o tempo em que nasceu e em que se mantém (a História e o Tempo são entendidos implacáveis.) É com base nisso que se sustenta a permanência do júri.
Como se apregoava, para uma exata manifestação sobre o júri, impõe-se recuar na história e no tempo. Cabe, portanto, chegar aos tempos gregos e partir para o exame do teatro que teve grandes dramaturgos e criadores em que, onde além de Ésquilo e Eurípides, despontou Sófocles. Todos muito ensinaram à humanidade. Usando suas obras, podemos fazer um paralelismo com os filósofos da mesma época, como Tales de Mileto, Sócrates, Platão, Aristóteles, Nicômaco e tantos outros. Cabe, então, formular uma questão importante. Quem ensinou mais à humanidade? Os filósofos com suas obras e seus seguidores ou os dramaturgos com suas criações teatrais?
Pode-se optar por uma ou por outra das relações citadas como a principal contribuição para a cultura. Ninguém, porém, se sentirá perdedor ante os argumentos contrários à posição que defende. Mas o certo é que, como as atuações filosóficas, as obras teatrais apresentam, também, grandes contribuições para a humanidade e seu desenvolvimento ético e cultural.
Seguindo nessa linha, mesmo que não se refira a Shakespeare, o Bardo genial, até hoje insuperável, cabe exemplar menção a Sófocles que muito contribuiu com suas criações para o mundo dito civilizado. Notável é sua peça Édipo, elemento central nas concepções e estudos sobre psiquiatria e psicanálise, além da dramaticidade que a todos sensibiliza, desde a morte de Laio e seu casamento com Jocasta e suas consequências. Em matéria jurídica também desponta o gênio de Sófocles no drama de Antígona ao contestar edito legal de Creonte, ditador de Tebas, que proibira seus súditos de dar sepultura aos seus oponentes mortos em batalha pelo poder.
Aliás, aqui já se referia à induvidosa matéria jurídica com inspiração filosófica, defendida pela vítima de Creonte, fazendo-o, sem dúvida, com eloquência desafiadora ao autor das leis, e contrapondo-se às regras dogmáticas. Argumenta Antígona que “não foi, com certeza, Zeus que as proclamou, nem a Justiça, com trono entre os deuses dos mortos, as estabeleceu para os homens. Nem supunha que tuas ordens tivessem o poder de superar as leis não escritas, perenes, dos deuses, pois elas não são de ontem nem de hoje, mas são sempre vivas, nem se sabe quando surgiram”.
Vê-se, portanto, a linha jurídico-filosófica nascida dos argumentos por ela desfiados. Em direito criminal, a peça Antígona desponta como verdadeira pedra angular da Justiça e do Direito Penal moderno e humanista. Portanto, o teatro muito ensina. Em uma entrevista, sugeria-se que os julgadores deveriam ir mais a teatros, a cinemas e a palestras onde sempre vicejam o direito e o humanismo.
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