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terça-feira, 25 de agosto de 2020

Casa: Abrigo ou desamparo? - COVID 19 - campo fértil para o aumento da Violência intrafamiliar

 

Artigo da Dra Melissa Telles, associada do IARGS e presidente do Instituto Proteger

Com a regra do isolamento social, procedimento necessário e adotado por quase todos os países do mundo para conter a disseminação da Covid-19 (Coronavirus), parece que a casa foi eleita o local de maior proteção. No entanto, infelizmente, este nem sempre é o local mais seguro, principalmente para àqueles em situação de vulnerabilidade. 

Isso porque é dentro do lar, na família, onde acontecem inúmeras violências e maus-tratos, e essa infeliz situação já vem contada e recontada pela história da humanidade - “Ainda que a violência com visibilidade seja a que ocorre fora de casa, o lar continua sendo a maior fonte de violência”[1]

Nesse aspecto, mostra-se relevante trazer as concepção da violência doméstica contra a criança e o adolescente, nas palavras de Guerra e Azevedo. 

Representa todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra crianças e adolescentes que – sendo capaz de causar dano físico, sexual, e/ou psicológico à vítima – implica, de um lado, uma transgressão do poder/dever de proteção do adulto e, de outro, uma coisificação da infância, isto é, uma negação do direito que crianças e adolescentes tem de ser tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar e desenvolvimento[2]

Marianne Hester, socióloga da Universidade de Bristol, que estuda relacionamentos abusivos, alerta que “A violência doméstica aumenta sempre que as famílias passam mais tempo juntas, como as férias de Natal e verão”[3]

A preocupação com o aumento da violência intrafamiliar é universal. Na China, relata-se que a violência doméstica triplicou durante o mandato de abrigo. Além disso, a França indicou um aumento de 30% nos relatórios de violência doméstica e, a Itália, também indicou que os relatórios de violência doméstica aumentaram durante o período de isolamento e distanciamento social. 

Na Espanha, de igual modo, surgiram relatos de um terrível homicídio relacionado à violência doméstica - uma tendência que, infelizmente, continuará em todo o mundo, à medida que o estresse continue a construir e a abrigar medidas locais que se estendam para o futuro. 

A crescente tendência global, de aumento de casos de violência doméstica, provavelmente se manterá durante toda a pandemia e pode representar apenas uma "ponta do iceberg", pois muitas vítimas ainda se veem presas ao agressor e incapazes de denunciar o abuso. 

Nos Estados Unidos, agências de todo o país também estão relatando um aumento na violência doméstica. Além do risco de dano físico, as vítimas também correm grande risco de dano emocional e de abuso psicológico. 

Nesse aspecto, surgiram relatos, nos Estado Unidos, de autores de violência doméstica, utilizando a Covid-19 como arma contra as suas vítimas, proibindo a lavagem das mãos na tentativa de aumentar o medo da vítima de contrair o vírus e ameaçando proibir o tratamento médico se a vítima contrair a doença[4]

No Brasil, a agressão contra a mulher aumentou em 44,9% só em São Paulo, de acordo com relatório divulgado no primeiro período de isolamento social, no dia 20 de abril, pelo Fórum de Segurança Pública (FBSP). Também houve um acréscimo de feminicídios no estado, de 13 para 19 casos – 46,2%. O mesmo aumento também aconteceu nos casos de exploração sexual infantil, no mesmo período, com um crescimento de 50%, apesar das subnotificações e silenciamento da vítima, já que o principal espaço de denúncia, a escola, está fechada. [5]

Diante disso, é preciso se fazer um alerta: o modelo de convivência instaurado e intensificado, por conta da COVD 19, é campo fértil para o alargamento da violação de direitos e, consequentemente, de opressão aos mais vulneráveis. Assim, fica desvelada a necessidade de um maior cuidado na Proteção da Família, por parte da sociedade e do Estado. 

Salientamos, assim, a importância da atuação da Rede de Proteção, principalmente neste momento, devendo, inclusive, atuar de forma preventiva, por meio dos mecanismos virtuais disponibilizados, como canais mais amplos de comunicação e denúncias. 

A recomendação é que as pessoas próximas, como vizinhos, ao perceberem que crianças e/ou adolescentes estão sendo vítimas de violência, denunciem por meio do número 100, da Secretaria de Direitos Humanos (SDH), do Governo Federal, cuja finalidade é receber denúncias relativas à violência sexual contra crianças e adolescentes. Somado a isso, é possível ligar para uma Delegacia de Proteção à Criança e Adolescente (DPCA) do seu município ou estado. De modo mais direto, acionar o Conselho Estadual da Criança e do Adolescente (CEDCA) do estado, solicitando ajuda. 

O importante é que sejam tomadas essas iniciativas, de modo rápido e efetivo. 

As autoridades e as instituições têm papel central. É preciso que os governos, assim como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Unicef, apresentem ações de proteção, evitando ainda mais o agravamento da vulnerabilidade infanto-adolescente. 

Com um dos pilares mais importantes ausente, a escola, surge como elemento que contribui para o aumento no índice de violência, haja vista que muitos relatos de abusos e agressões sobrevêm no meio escolar e, sem esse mecanismo, as crianças e adolescentes se manterão mais isolados da proteção estatal e mais próximas ao agressor[6]

Sem sombra de dúvidas, a violência sistemática contra crianças e adolescentes causará traumas e as consequências psicológicas virão pós-pandemia, com o adoecimento físico e emocional, desenvolvendo comportamentos autodestrutivos ou mesmo transtornos psicológicos. 

Diante dessa preocupante realidade, destacamos a importância de iniciativas, como a realizada por Maria Farinha Filmes, Instituto Liberta e Alana, que lançou o documentário Um Crime Entre Nós, dirigido por Adriana Yañez, no qual investiga os motivos que posicionam o Brasil em segundo lugar entre os países com maior número de ocorrências de Exploração Sexual Infantil, segundo a The Freedom Fund. 

Acreditamos que, em cada criança, deveria ser estampada a frase: tratar com cuidado, contém sonhos. Essa, escrita, feita por um autor desconhecido, que já circulou nas redes sociais, contém singela, mas profunda verdade – que, muitas vezes, é ignorada por aqueles que mais deveriam zelar: a família.


[1] KRISTENSEN, Chistian Haag; OLIVEIRA, Margrit Sauer; FLORES, Renato Zamora. Violência contra crianças e adolescentes na Grande Porto Alegre. In: et al. Violência doméstica. Porto Alegre: Fundação Maurício Sirotsky – AMENCAR, 1998, p.115, apud Azambuja. Maria Regina Fay de. Incesto e Alienação Parental, Coordenado por Maria Berenice Dias, 3ed. p. 388. 


[2] AZEVEDO, M. A. e GUERRA, V. N. (orgs) Infância e Violência Doméstica: fronteiras do conhecimento. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 1997, p. 32-33. 


[3] Hester, Marianne. Disponível em <https://www.nytimes.com/2020/04/06/world/coronavirus-domestic-violence.html> acesso em 12.05.2020. 


[4] Andrew M. Campbell. Journal Pre-proof : An Increasing Risk of Family Violence during the Covid-19 Pandemic: Strengthening Community Collaborations to Save Lives p. 04. Acesso em 12.05.2020. 




[6]As situações de abuso sexual infantil têm alta prevalência em nosso país. Com base no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN)1 do Ministério da Saúde, no período de 2014 a 2018, foram registrados 29.628 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes, sendo que 87% são recorrentes (12.522 casos), acometidos por pessoas do universo familiar: por pais (12%), padrastos (12%) e outras pessoas conhecidas (26%). Dados do Disque 100(serviço ligado ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, que recebe denúncias anônimas sobre violências em todo o território brasileiro), referentes a 2018, apresentam um total de 17.093 denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes no país. Desse total, 13.418 denúncias se referiam a abuso sexual e 3.675 foram registrados como exploração sexual. Nos casos de abuso sexual, 73,44% das vítimas eram meninas e 18,60% meninos. Cerca de 90% das denúncias de abuso sexual eram de caráter intrafamiliar, sendo que 70% dos casos tem como autor o pai, o padrasto ou a mãe da criança. Fonte Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Disponível em <https://www.spsp.org.br/2020/05/19/isolamento-social-e-riscos-de-abuso-sexual-infantil/>. Acesso em 13.08.2020.

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

IARGS oferece primeiro curso on-line: Mesa Aberta- Eleições e pandemia na visão da advocacia

Pela primeira vez, o Instituto dos Advogados do RS promoverá um curso on-line totalmente gratuito. Será uma Mesa Aberta intitulada “Eleições e pandemia na visão da advocacia”, que acontecerá ao vivo no Canal do Youtube do IARGS, no próximo dia 28 de agosto, sexta-feira, das 15h às 17h. Os coordenadores do evento são a vice-presidente e diretora do Departamento de Direito Eleitoral do Instituto, Dra Lucia Kopittke, e o especialista na área de Direito Eleitoral e Mestre pela UFRGS, Dr Rafael Morgental. 

Os quatro palestrantes serão os seguintes: Dr Luiz Fernando Pereira, Doutor pela UFPR; a Dra Maria Cláudia Bucchianeri, Mestre pela USP; Dra Marilda Silveira, Doutora pela UFMG; e Dr Walber Agra, Doutor pela UFPE. Eles dividirão o tempo debatendo sobre o assunto em questão. 

A Dra Lucia Kopittke salienta a importância deste evento, destacando entre os efeitos da pandemia nas próximas eleições: “Trata-se de um momento histórico, nunca vivido por nenhum de nós; vamos ter uma eleição em silêncio, na qual a propaganda será, na sua maioria, por meio das redes sociais o que permite o disparo de Fake News, motivo pelo qual cada um deve estar atento à necessidade de votar com consciência, dando bastante atenção às plataformas de cada candidato, não levando em consideração apenas projetos relacionados à Covid-19. 

No entendimento da Dra Lucia, não deve haver analogias relacionadas à Covid neste momento eleitoral, “pois temos que nos conscientizar sobre a importância dos próximos quatro anos de Governo, no que tange à economia, à educação e à política, e é nosso dever procurar saber o máximo possível sobre como vão se realizar essas eleições, dentro das atuais limitações apresentadas”. 

O Dr. Rafael Morgental acentuou o empenho do IARGS em oferecer à comunidade jurídica informações atuais e confiáveis sobre o processo eleitoral de 2020, na visão de quem mais entende do assunto no país. Daí o convite a colegas com destacada produção acadêmica e projeção nacional na advocacia para compartilhar um pouco de suas experiências em campanhas municipais, estaduais e presidenciais e a arriscar uma projeção sobre o que nos espera. 

“As eleições são o momento em que a política toma as ruas. Em meio a uma pandemia, boa parte da disputa se desloca para a nuvem, o que afeta todas as dimensões da campanha, desde a propaganda eleitoral até a atuação dos advogados perante a justiça eleitoral. Vamos instigar o debate entre quatro grandes referências do Direito Eleitoral brasileiro a respeito dessa inédita combinação entre democracia e pandemia”, informou o advogado. 

O Canal do Youtube do IARGS é o seguinte: https://www.youtube.com/c/IARGSInstitutodosAdvogadosdoRS/videos


Terezinha Tarcitano 
Assessora de Imprensa 

Dr Ricardo Breier - manifestação sobre o livro IARGS 93 anos


Manifestação do presidente da OAB/RS, Dr Ricardo Breier, associado do IARGS

Em certa oportunidade, o orador romano, Marco Túlio Cícero, afirmou: “A história é testemunha do passado, luz da verdade, vida da memória, mestra da vida e anunciadora dos tempos antigos.”

Registrar a nossa história é absolutamente fundamental para uma sociedade que busca se desenvolver a partir de sólidas estruturas. Quando o Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul (IARGS) lança um livro sobre seus 93 anos de caminhada, essa contribuição transcende uma sempre necessária obra literária. Estamos falando da entrega de um legado de quase um século de atividade.

Há séculos, afirmou Cícero: a história é a luz da verdade. O trabalho do IARGS, nestas mais de nove décadas, é forjado na entrega, na dedicação e na competência de muitos advogados e de muitas advogadas. É uma rica e incomparável contribuição, feita a partir das tantas lutas, de tantos eventos e engajamentos do Instituto. Um das virtudes do IARGS reside exatamente na força da sua representatividade e na capacidade de se manter fundamental para a sociedade gaúcha e brasileira.

Desta forma, parabenizo a Dra. Sulamita dos Santos Cabral, um exemplo de mulher e advogada, pela concretização desta obra. É um grande exemplo de postura que ajudou a construir essa pulsante história de 93 anos do IARGS. Um registro fundamental para as novas gerações; um reconhecimento para tantos nomes que emprestaram seus talentos a esta sólida trajetória do Instituto. Uma obra histórica.

terça-feira, 18 de agosto de 2020

A Nova Advocacia Chegou


Artigo do Dr André Jobim de Azevedo, Advogado (OABRS 21.172), bacharel pela URFGS, Membro do Conselho Superior de Arbitragem da OAB/RS, sócio de Faraco de Azevedo Advogados, Diretor Executivo (ex-presidente ) CAF Câmara de Arbitragem da Federasul, professor universitário.

Tema: A Nova Advocacia Chegou

Estamos no mês do advogado,11 de agosto dia em que celebramos por conta da criação das duas primeiras faculdades de direito no país, os primeiros cursos jurídicos, em 1827: a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo; e a Faculdade de Direito de Olinda, em Pernambuco, criadas por D. Pedro I. Mais um aniversário para tão linda profissão, que sustenta o Direito e é indispensável à Justiça. Não se trata, contudo, de mais um ano apenas. Ano singularíssimo. Claro que, desde a criação das faculdades, outros houve, mas neste século e, desde outras importantes crises de saúde pública, do século passado, esta muito particular. Destacada não somente por seus contornos na questão da saúde, mas pelos efeitos igualmente econômicos e ao que aqui nos interessa jurídicos e de exercício profissional da advocacia. 

Sei que sou, mas não me acho velho, são ininterruptos quase 40 anos de escritório , 36 de formado e 30 de docência superior. Nesta caminhada nada me surpreendeu tanto quanto a Pandemia. A malvada Covid 19, ainda de contornos e futuro indefinidos, nos chacoalhou a vida. A tecnologia avançada, notadamente na comunicação, andava a passos rápidos sobre os escritórios, mas mal praticamos os processos eletrônicos e é presente a inteligência artificial. 

Neste aspecto, que bom que alguns ramos do Judiciário já estavam neste compasso. A justiça Federal, a Justiça do trabalho e, neste rumo, todos os tribunais buscando a eficiência e a modernização pela tecnologia. Um, já não tão novo CPC que assim prospecta. A necessidade de isolamento por determinação dos governos nos impôs quarentena, o que levou os escritórios a prática intensa - senão total - de homeoffices. As reuniões presenciais, até então menos frequentes, transferidas integralmente para a plataforma zoom e outras, possibilidade essa que “salvou” nossos relacionamentos profissionais. Nossas atividades, basicamente de consultoria e procuradoria (atuação judicial), foram possíveis, ora nos moldes virtuais. Claro com menor efetividade na relação com os clientes e captação de novos. 

Igualmente no que respeita ao atuar judicial, andando, mas com dificuldades importantes. Sem despachos e sustentações orais presenciais, diligências, audiências de produção de prova. As conciliatórias, as inaugurais estão andando... insisto com dificuldades e riscos. As demais ainda indefinidas. O Judiciário, açodando esta virtualização, bem intencionado para que não se aumentem resíduos e pendências que tomará anos a atingir um certo reequilíbrio, mas que incrementou nosso risco. 

Os memoriais e as sustentações orais virtuais não se comparam aos atos presenciais. Enorme o desafio de atenção nos julgadores nos atos presenciais, nos virtuais, obviamente...muito maior, com efeitos diretos sobre o convencimento e resultado da causa. Isto, temo dizer, passará a ser a regra...O que mais preocupa, contudo, é que não temos boas condições de infraestrutura de internet, pressuposto básico para a nova era e atuação digital. O acesso à internet, não sem razão, já é dito por alguns como um direito fundamental com a necessária inclusão digital. Ou será que este acesso existe, por exemplo nos rincões do meu Alegrete? Temo que não... 

Sem esse direito instrumental de comunicação e acesso, hoje pressuposto da vida, os demais periclitam igualmente. Esta semana mesmo, depois de aguardar minha vez de sustentar oralmente desde o escritório (onde montei uma “sala de audiências” com monitor moderno, iluminação, som e acesso de rede duplicado por segurança), a partir das 1345h, só chegou a minha vez, às 1815h, para “Murphy” agir e cair a conexão . As duas - que cautelosamente instalei. Só não enfartei porque durou um minuto, que pareceu um século. 

Esta deve ser uma bandeira comum, que se atenda ao pressuposto instrumental básico para que possamos trabalhar por esta nova via. Lembro que, se alguns de nós podemos nos regozijar do resultado econômico de nosso trabalho, isto está longe de ser a regra. Veja-se que a OAB/SP disponibilizou aos advogados membros, o auxílio emergencial de R$ 100,00 (isto mesmo, cem reais) e foi requerido por mais de 18.000 advogados. Terão esses condições de exercício profissional mínimo? Essa é a realidade. Não fora isto, a insegurança jurídica reina, o que, além de estressar, leva à dubiedade na orientação jurídica de nossa obrigação. Quem orientou, por exemplo, a aplicação da MP 905 , sobre o Contrato de Trabalho Verde e Amarelo, a emergencial MP 927 e que caducaram (perderam efeito), têm a exata dimensão do que tento evidenciar. E os julgamentos de constitucionalidade do STF? E a aplicação intertemporal do direito de medidas que vigeram por determinado tempo? Os que dela se utilizaram? 

As dúvidas jurídicas são profundas e sérias... geraram efeitos até quando ou deixam de gerar? Desculpem-me se, instado a tratar de tema técnico (e são dezenas que poderia fazê-lo: Lei de Proteção de Dados, mediações, arbitragens, Inteligência Artificial aplicada, MPs emergenciais, inconstitucionalidades , auxílio e financiamentos empresarias...) não o fiz, mas as questões acima suscitadas antecedem e não puderam ser evitadas.

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Dra Alice Grecchi - manifestação sobre o livro IARGS 93 anos



Manifestação da Dra Alice Grecchi, vice-presidente e diretora do Departamento de Direito Tribuário do IARGS

O maior patrimônio da humanidade é sua história. Resgatá-la, perpetuar seus valores e valorizar suas conquistas são formas de garantir que as novas gerações tenham uma base cultural sólida. Positivamente, um povo que não se preocupa com a preservação de sua memória acaba por exterminar sua cultura. 

Pois bem. o IARGS - Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul - é uma das instituições mais antigas e tradicionais do Estado, tendo precedido e criado a própria OAB/RS. 

Em boa hora, portanto, a Dra. Sulamita Santos Cabral, auxiliada por sua dinâmica equipe, registrou, com grande maestria, no LIVRO COMEMORATIVO AOS 93 ANOS DO IARGS, a história desta modelar entidade e de seus grandes feitos. 

Em suas 403 páginas, a obra narra a brilhante trajetória do IARGS e enaltece, de modo especial, o trabalho e a dedicação de todos quantos, de uma forma ou de outra, contribuíram para que ele se tornasse o que é hoje: um dos baluartes jurídicos do Estado do Rio Grande do Sul. 

Na condição de ex-presidente do Instituto, só me resta agradecer à Dra. Sulamita Santos Cabral, sua atual presidente, por haver liderado, com idealismo e competência, este desafiador projeto que, sem sombra de dúvida, servirá para que os futuros juristas compreendam a importância e o alcance do associativismo de Juízes, Promotores, Procuradores, Advogados, Professores, enfim, dos cultores do Direito e da Justiça.

domingo, 16 de agosto de 2020

Presidente do IARGS participa da IX Conferência Estadual da Advocacia

A presidente do IARGS, Sulamita Santos Cabral, participou de forma on-line da IX Conferência Estadual da Advocacia, promovida pela OAB/RS, do qual o instituto foi apoiador institucional, no dia 14 de agosto, das 14h às 16h, no painel intitulado de “Democracia Digital no Brasil e no Mundo”, quando atuou como Presidente de Mesa. Na oportunidade, a Dra Sulamita fez uma saudação especial ao presidente da OAB/RS, Dr Ricardo Breier, coordenador-geral do evento; ao ex-presidente da OAB Federal, Dr Claudio Pacheco Prates Lamachia; e à coordenadora científica e executiva da conferência, Dra Fabiana Azevedo da Cunha Barth, secretária-geral adjunta da OAB/RS.

Os palestrantes da Mesa foram os seguintes: Dr Juarez Freitas (professor da PUCRS e UFRGS (Doutor em Direito; e Dra Flavia Piovesan (advogada. professora doutora da PUC/SP). O relator foi o Dr Rodrigo Puggina (coordenador de Direitos Humanos da CDH-OAB/RS). Os debatedores foram: Dr Ricardo Hermanny (diretor de cursos especiais da ESA-OAB/RS) e Dra Silvia Cerqueira (presidente da Comissão Nacional de Promoção da Igualdade do CFOAB).


terça-feira, 11 de agosto de 2020

A criação dos Cursos Jurídicos no Brasil e Dia do Advogado

 


Artigo da presidente do IARGS, Dra Sulamita Santos Cabral

Tema: A criação dos Cursos Jurídicos no Brasil e dia do Advogado


No mês de agosto a classe jurídica comemora a criação dos cursos jurídicos no Brasil e o Dia do Advogado.

Através do Decreto Imperial de 11 de agosto de 1827 foram criadas as Faculdades de Direito de São Paulo e a Faculdade de Direito de Olinda, Pernambuco, concretizando o projeto apresentado, em 1823, pelo Deputado José Feliciano Fernandes Pinheiro. 

Atendendo aos apelos recebidos de estudantes brasileiros que estudavam em Portugal e que, após a Independência do Brasil, passaram a sofrer humilhações, o Deputado Geral da Assembleia Constituinte pelo Rio Grande do Sul, José Feliciano Fernandes Pinheiro, brasileiro, formado em Direito na Universidade de Coimbra de Portugal, propôs a criação de uma Faculdade de Direito no Brasil. 

O projeto recebeu aprovação da Assembleia, mas, com a dissolução da mesma, pelo Imperador Dom Pedro I, o projeto teve que ser adiado. 

Em 1824, o Imperador Pedro I nomeou José Feliciano Fernandes Pinheiro Presidente da Província de São Pedro, primitiva denominação do estado do Rio Grande do Sul. Homem culto e realizador, permaneceu no cargo até 1826 realizando excepcional administração. Fundou a primeira tipografia regional, contribuiu para a ampliação da Santa Casa de Misericórdia, incentivou o desenvolvimento da província, realizou importantes obras e promoveu o assentamento de imigrantes alemães, fixando-os em São Leopoldo. 

Por seus méritos foi agraciado, em 1826, com o título de Visconde de São Leopoldo e, pouco mais tarde, nomeado Ministro da Justiça. 

Nesse ínterim, muitas vozes no Império defendiam a importância de haver uma cultura jurídica nacional e uma estrutura judicial própria, fruto de um pensamento brasileiro, independente de Portugal. 

Em 1827, José Feliciano Fernandes Pinheiro conseguiu concretizar seu antigo projeto de criação de cursos jurídicos no Brasil. Através do Decreto Imperial, de 11 de agosto de 1827, foram criadas as Faculdades de Direito de São Paulo e a Faculdade de Direito de Olinda. 

Os bacharéis formados podiam ser juízes, membros do Ministério Público ou procuradores da coroa e advogados. 

A criação das Faculdades de Ciências Jurídicas e Sociais, assim chamadas, teve grande impacto na vida do país, pois formou uma elite brasileira de pensadores que passaram a atuar no campo político, jurídico e social, promovendo o ordenamento jurídico, a organização judiciária, servindo de mediadores entre os interesses públicos e privados ou entre interesses privados e propiciando o estudo e debates de grandes questões nacionais. 

É importante destacar que as faculdades formavam os Bacharéis em Ciências Jurídicas e Sociais, mas não havia nenhuma restrição ao exercício da advocacia praticado pelos não formados, os “rábulas”, assim chamados os que advogavam sem ter diploma. 

Em 1843 foi criado o Instituto dos Advogados Brasileiros, congregando os Bacharéis e tendo como um dos objetivos principais a regulamentação da profissão de advogado. Os órgãos similares que foram surgindo nos Estados de São Paulo, Bahia, Pernambuco e Rio Grande do Sul agregaram força a essa luta. 

O nosso Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul, fundado em 26 de outubro de 1926, por uma feliz conjuntura, teve um papel relevante para a criação da Ordem dos Advogados do Brasil e regulamentação da profissão de advogado. 

A Revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas ao poder, tinha como um dos principais líderes Osvaldo Aranha, sócio fundador do nosso Instituto. 

Conta-se que no conturbado dia 03 de outubro de 1930, quando eclodiu a revolução, a Diretoria do Instituto decidiu, por maioria, ir até ao Palácio Piratini para se solidarizar com o movimento. Recebidos por Osvaldo Aranha, obtiveram a promessa de, caso vitoriosa a revolução, criar a Ordem dos Advogados para regulamentar a profissão. 

A promessa foi cumprida... 

No dia 19 de outubro de 1930, Getúlio Vargas, Chefe do Governo Provisório, assinou o Decreto nº 19.408 que dispôs: 

Artigo 17- “Fica criada a Ordem dos Advogados Brasileiros, órgão de disciplina e seleção dos advogados, que se regerá pelos estatutos que forem votados pelo Instituto dos Advogados Brasileiros, com a colaboração dos Institutos dos Estados, e aprovados pelo Governo.” 

Assim sendo, neste dia 11 de agosto, os advogados, além de enaltecer a figura de Jose Feliciano Fernandes Pinheiro, não podem ignorar o trabalho desenvolvido pelos Institutos que, desde o tempo do Império, lutavam para a regulamentação da profissão de advogado e foram decisivos para a organização da Ordem dos Advogados Brasileiros. Também, é preciso reconhecer a atuação meritória de Osvaldo Aranha para que, após quase noventa anos de lutas, Getúlio Vargas assinasse o Decreto que regulamentaria a profissão de advogado. 

A lei 13.599, publicada em 09 de janeiro de 2018, inscreveu o nome de José Feliciano Fernandes Pinheiro, Visconde de São Leopoldo, como Herói Nacional, no Livro de Heróis e Heroínas da Pátria. Com páginas de aço, o livro encontra-se no Panteão da Pátria Tancredo Neves, na Praça dos Três Poderes, em Brasília. 

A referida Lei foi iniciativa do Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul e contou com o apoio da OAB/RS, da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre e do Instituto histórico e Geográfico do RS e foi apresentada pelo Deputado Federal Giovani Cherini. 

Trata-se de uma vitória conjunta, que registra o justo reconhecimento pelos inúmeros feitos do Visconde de São Leopoldo em prol do país. 

Evocamos, também, a memória e os feitos de Levy Carneiro, Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros e primeiro Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil e de Leonardo Macedônia, Presidente do Instituto dos Advogados do RS e primeiro Presidente da OAB gaúcha (1932) e suas diretorias que, vencendo os obstáculos, conseguiram implementar a nova Ordem dos Advogados no país. 

Saudamos a todos os operadores do Direito louvando o labor diuturno de advogados, magistrados e membros do Ministério Público que, através de trabalho digno e responsável, cumprem seus deveres para com a sociedade. 

Para concluir, tributamos nossas homenagens a Cláudio Pacheco Prates Lamachia que, após presidir, exemplarmente, a OAB/RS, foi o primeiro gaúcho a assumir a Presidência do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil em 23/02/2016. 

Advogado emérito, teve um importante papel na história do Brasil, sempre na defesa da ética e da advocacia, dos direitos humanos, da democracia e da justiça e que ainda tem muito a contribuir para a grandeza de nossa Pátria.

segunda-feira, 10 de agosto de 2020

Dr Claudio Pacheco Prates Lamachia - manifestação sobre o livro IARGS 93 anos

 


Manifestação do Presidente da Comissão de Relações Internacionais da OAB, Ex-Presidente e membro honorário vitalício do CFOAB e da OAB/RS, Presidente da União dos Advogados de Língua Portuguesa e associado do IARGS, Dr Claudio Pacheco Prates Lamachia


É sempre uma honra falar do Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul, nosso querido IARGS, cuja história nos orgulha e que teve papel vital no trabalho de organização da OAB no nosso Estado. Nesses 93 anos de história, o IARGS tem sido parceiro da OAB Gaúcha nos mais diversos assuntos, tendo atuado em temas transcendentais como direitos humanos, anistia política, soberania, democracia e justiça, representando os interesses da advocacia e da cidadania.

À frente da OAB Nacional e da nossa querida OAB/RS, tive a oportunidade de vivenciar pessoalmente essa parceria e juntamente ao IARGS, em cumprimento ao preponderante papel outorgado à Ordem por nossa Carta Magna, contribuir para a Advocacia e a sociedade. 

Por isso, sem dúvida, sua valorosa história deve ser sempre registrada para que as gerações futuras tenham em mente o glorioso trabalho realizado pelo IARGS nesses anos de existência. E a obra histórica “93 Anos 1926-2019” retrata belamente o período, com fotos e os mais importantes eventos realizados pelo Instituto, entre congressos, seminários, palestras, reuniões-almoço e homenagens. 

Assim, na pessoa da competente e talentosa, Dra. Sulamita Santos Cabral, estimada amiga e Presidente do IARGS, presto meus efusivos cumprimentos aos organizadores da referida obra, bem como a todos aqueles que contribuíram para essa valorosa história.

terça-feira, 4 de agosto de 2020

Breve comentário sobre reflexos da pandemia no Direito



Artigo do Norberto da Costa Caruso Mac Donald, integrante do Conselho Superior do IARGS

Tema: Breve comentário sobre reflexos da pandemia no Direito


1. A complexidade e a abrangência do tema proposto impõem que sua apreciação, numa rápida síntese, se limite a alguns aspectos gerais, sem que se ouse apontar soluções ou pretender originalidade. 

2. O cientista político Yascha Mounk [1] observa: “Existem décadas intermináveis, em que a história parece se arrastar. E existem também anos breves em que tudo muda abruptamente. É o tipo de momento em que vivemos hoje. “ Mais adiante, prossegue: “Até pouco tempo atrás, a maioria de nós vivia em uma época normal. Agora, em comparação, estamos ingressando em uma época extraordinária.” 

3. Sendo essa manifestação anterior à pandemia que ora assombra a humanidade, cabe indagar: o que esperar de um futuro próximo afetado por suas consequências? Será suficiente classificá-lo apenas como uma época extraordinária, análoga à em que vivíamos? 

4. A elaboração de uma resposta pressupõe, primeiramente, esboçar um quadro da época pré-pandemia sob alguns enfoques relevantes por seu reflexo no Direito e por serem ilustrativos das mudanças que vêm ocorrendo, suscetíveis de particularizar a época mencionada como “extraordinária”. 

5. Para esse efeito, pela importância e amplitude de seu alcance, destaca-se a globalização, que tem entre suas características, como salienta Francesco Galgano [2], a crescente “transnacionalidade” do comércio e das finanças, bem como as dimensões transnacionais assumidas pela economia industrial. Considerando a evolução histórica da empresa, no estágio atual todas as suas funções clássicas se internacionalizam. Não são só as mercadorias que circulam além dos confins nacionais; a própria organização produtiva e distributiva se desloca e se ramifica em âmbito internacional. 

6. Certamente, a globalização, em que sobressaem aspectos econômicos, se reflete no Direito, quer se sustente que o “modo de produção capitalista” gera a ordem jurídico-política de que necessita a cada estágio de seu autodesenvolvimento, quer se entenda, como Pierre Dardot e Christian Laval [3], que longe de pertencer a uma “superestrutura” condenada a exprimir ou obstruir o econômico, o jurídico pertence de imediato às relações de produção, na medida em que molda o econômico a partir de dentro; em abono desse entendimento, os referidos autores destacam o “ordoliberalismo”, que se impôs na República Federal da Alemanha após a guerra: uma realidade construída (“projeto construtivista”), que requer a intervenção ativa do Estado, assim como a instauração de um sistema de Direito específico. Enfim, a autonomia do Direito contém a possibilidade de interação entre os fatos jurídicos e econômicos. 

7. Perquire-se como numa sociedade globalizada podem encontrar adequada proteção a liberdade e os direitos humanos; como se pode alcançar o devido respeito pela soberania dos Estados; como se pode transferir ao governo de uma sociedade pós-nacional os princípios democráticos surgidos historicamente nos âmbitos nacionais; que mudanças se devem produzir na organização jurídica dos mercados; como assegurar uma tutela eficaz a consumidores e trabalhadores além das estruturas do Estado e de uma organização territorial. 

Sugere-se que a maneira de neutralizar o “déficit democrático” da globalização seria através de uma entidade transnacional – não foi Kant quem, mais de duzentos anos atrás, viu a necessidade de ordem legal transnacional baseada na ascensão da sociedade global? Entretanto, a efetivação de um Estado-universal, com uma cidadania e um direito comuns a todos, dadas as dificuldades até o presente não superadas, ainda se apresenta como uma utopia. 

De fato, hoje o Estado encontra-se expropriado de uma parcela de seu antigo poder, o qual foi capturado por forças supra-estatais (globais) que operam num espaço politicamente incontrolável. Abriu-se uma profunda contradição entre as dimensões transnacionais das grandes empresas e o caráter nacional dos sistemas jurídicos em que elas atuam: de que vale o poder de tributar dos Estados se os contribuintes são empresas que se subtraem à imposição fiscal colocando em outro país a holding em que se realizam os lucros sujeitos a tributação? E de que vale a imposição de contribuições previdenciárias, se as empresas transladam para fora do território do Estado as controladas que administram os estabelecimentos industriais? Essas questões foram formuladas por Francesco Galgano. 

Malgrado suscitar problemas, a globalização se mostra irreversível, sobretudo se encarada como decorrência das novas tecnologias de comunicação, que levaram a remover as barreiras físicas do espaço e transformar os habitantes da Terra em membros de uma aldeia global. O que falta é uma regulamentação adequada a assegurar a coexistência harmônica entre globalização e Estados -nações, que, embora com sua concepção clássica alterada, continuam como centros de autoridade 

8. Outro tema que tem sido objeto de preocupação em várias áreas, com consideráveis reflexos na esfera do Direito, diz respeito a consequências da terceira revolução industrial da microeletrônica, na qual uma máquina guiada por um computador substitui o trabalho do homem. Sustenta-se que a sociedade mundial do trabalho alcança seu limite histórico, em razão de que a desvinculação, cada vez maior, na sequência dessa revolução, da produção de riqueza do uso do trabalho humano, – numa escala que há poucas décadas só era imaginada como ficção científica – provoca liberação de energia humana, e aqui liberação significa também mal-estar ou desocupação. 

O nexo entre sociedade eletrônica e diminuição da ocupação na indústria resta evidente. 

9. As considerações apresentadas afiguram-se suficientes para confortar a observação inicial de que nossa época pode ser caracterizada como “extraordinária” em virtude da importância e do ritmo das mudanças que se realizam. Porém, tendo em conta que essas ocorrem há algum tempo, tal particularidade, é possível dizer, se “normalizou”. Mas, sobreveio a pandemia, cuja dimensão dos efeitos seria prematuro adiantar; o que não impede constatar alguns fatos que já vêm acarretando consequências. 

10. Com esse intuito, cabe, desde logo, destacar o papel primordial desempenhado pelos Estados nacionais, em seus vários níveis de poder, em que pese o declínio do governo público da economia. Como em crises anteriores, são eles que – embora em graus diversos de preocupação e eficácia – coordenam as providências tendentes a enfrentar a pandemia. A ação dos Estados tem se mostrado insubstituível sob os enfoques sanitário e econômico. 

11. Embora ainda não se tenha estabelecido um acordo internacional de cooperação e solidariedade para lutar contra o vírus, vem se reforçando a relevância do relacionamento harmônico entre os Estados nacionais e entre estes e entidades nacionais e supranacionais, públicas e privadas, na busca de medicamentos para combater a doença e de uma vacina para debelá-la. Noticia-se a tentativa da comunidade internacional de fechar um acordo antes que vacina, ora em pesquisa, chegue ao mercado; outrossim, que o correspondente projeto tem recebido crítica centrada na preservação da patente, sem qualquer indicação de flexibilização ou mesmo de suspensão. Importante orientação de caráter geral vem sendo ditada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Que eficácia teriam regulamentos exclusivamente nacionais em questões que extrapolam as fronteiras dos Estados, como a preservação do planeta e a saúde de seus habitantes? Conforme a lição de Yascha Mounk, “ a finalidade de um acordo internacional é coordenar as ações de diferentes países a fim de estabelecer expectativas estáveis e capacitá-los a atingir um objetivo comum. Assim, a perda resultante de controle nacional resultante da sujeição a acordos internacionais não é um defeito do sistema de acordos internacionais; é sua característica principal.” 

12. Outra questão, talvez a que mais se tenha acentuado com a pandemia, diz respeito à crescente desigualdade ligada à progressiva e intensificada concentração de renda. 

Aqui, não se trata de uma suposição, mas de um fato comprovado por pesquisas e estatísticas, enfatizado por economistas e cientistas sociais que, inclusive, o apontam como um dos mais destacados fatores da desesperança em relação ao futuro. Variam as soluções aventadas para eliminar, ou, ao menos, minimizar esse problema; mas não se contesta a sua existência. 

É verdade que, no momento atual, assiste-se ao recrudescimento de movimentos de solidariedade liderados por entidades da sociedade civil. O que se espera é que tal solidariedade, tão necessária agora, se estenda a um decisivo apoio a políticas públicas que visem a enfrentar as desigualdades. 

Acaso seria quimérico desejar que, num futuro próximo, a solidariedade pudesse, em momentos de crise, se concentrar mais num apoio moral por estarem atendidas as necessidades materiais básicas da população em geral? 

Numa passagem instigante, John Rawls [4] adverte: “A distribuição natural [de talentos] não é justa nem injusta; tampouco é injusto que as pessoas nasçam em uma determinada posição na sociedade. Esses fatos são simplesmente naturais. O que é justo ou injusto é a maneira como as instituições lidam com esses fatos.” 

13. Neste passo, oportuno lembrar uma colocação de Zygmunt Bauman [5] que, em suma, afirma que a “Grande Guerra”(1914 – 1918) solapou a confiança que, a partir do terremoto de Lisboa (1755), havia sido, por quase dois séculos, investida na substituição da aleatoriedade cega da natureza por uma ordem construída por seres humanos, guiada pela razão; esta, todavia, não se mostrou capaz de superar a imprevisibilidade de que a natureza fora acusada. No presente, após um período de acelerado desenvolvimento científico e tecnológico, somos surpreendidos por uma catástrofe imprevista e global no sentido de que atinge a todos e de se estender a várias esferas da vida humana. Enquanto não dispusermos dos meios para vencer a pandemia, continuamos todos vulneráveis. 

Variam, porém, as condições materiais para enfrentar o mal. Se a superveniência de situações excepcionais permanece, não raro, imprevisível, previsível se mostra que a adoção preventiva de medidas tendentes a reduzir as desigualdades seriam eficazes. 

14. Enfim, o exame das atuais circunstâncias demonstra que a época pós-pandemia não será passível de ser classificada apenas como “extraordinária” à semelhança daquela anterior à doença. Porém, como o momento presente, será também uma época “excepcional” ou “atípica”: exigirá medidas de maior alcance, cuja urgência está sendo evidenciada. Espera-se que a “atipicidade” seja caracterizada não só pela quantidade e excepcionalidade de medidas tomadas pelo poder público, mas que essas, assim como os comportamentos individuais e coletivos, reflitam lições extraídas da pandemia. 

É justamente em tempos como os atuais que se intensifica a necessidade de uma forte e decisiva atuação na esfera jurídica. 


Referências bibliográficas 

[1] Yascha Mounk – O povo contra a democracia – Companhia das Letras, São Paulo, 2018 

[2] Francesco Galgano – La globalizzazione nello specchio del diritto – Ed. Il Mulino, Bolonha, 2005 

[3] Pierre Dardot e Christian Laval – A nova razão do mundo – Boitempo Editorial, São Paulo, 2016 

[4] John Rawls – Uma teoria da justiça – apud Michael J. Sandel – Justiça – Civilização Brasileira –Rio   

de Janeiro, 2014 

[5] Zygmunt Bauman – A arte de vida – Jorge Zahar Ed., 2009 

domingo, 2 de agosto de 2020

Dra Anna Vittoria Pacini Teixeira - manifestação sobre o livro IARGS 93 anos




Manifestação da Dra Anna Vitória, integrante do Conselho Fiscal e coordenadora das reuniões-almoço e do jantares comemorativos de aniversário do IARGS. 

Recebi da nossa estimada e incansável Presidente, Dra. Sulamita Santos Cabral, o livro alusivo aos 93 anos do Instituto dos Advogados do Rio Grande Sul. 

Com encantamento e emoção, ao folhear lhe as páginas, foram surgindo e materializando-se à minha frente as figuras e personalidades integrantes do mundo jurídico daquela época, que deram vida ao Instituto dos Advogados. 

A busca do direito, da justiça e da ética continua ainda hoje, fruto do empenho, da dedicação e do comprometimento dos seus integrantes. 

Com muito orgulho, sou associada desde 1998, participo do Conselho Fiscal e também coordeno as exitosas reuniões-almoço mensais do nosso Instituto, nas quais, além do brilho dos palestrantes convidados, se faz presente o forte vínculo que congrega e une os integrantes do Sodalício 

À Dra. Sulamita, autora do Livro, externo minha estima e admiração.