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quinta-feira, 20 de março de 2025

Núcleo de Debates entre Direito e Literatura apresenta a obra Danações, de Carlos Nejar

Na primeira edição do ano do Núcleo de Debates entre Direito e Literatura, uma promoção entre o IARGS e a Faculdade de Direito da UFRGS, realizada ontem, dia 18/03, no Pantheon, da Universidade de Direito da UFRGS, o convidado foi o poeta Carlos Nejar sobre o livro de sua autoria escrito em 1969, “Danações”. Participaram como debatedores os advogados Dr. César Vergara de Almeida Martins Costa e a Drª Dineia Anziliero Dal Pizzol, coordenador e coordenadora-adjunta do Núcleo; e o Professor Doutor em Psicologia Social, Dr. Leonardo Martins Costa Garavelo.

Abertura

Compuseram a Mesa de Abertura as seguintes autoridades: a Presidente do IARGS, Drª Sulamita Santos Cabral e o membro do Conselho Superior do IARGS Dr. César Vergara de Almeida Martins Costa; os debatedores; e a Diretora da Faculdade de Direito da UFRGS, professora Ana Paula Motta. Também participaram do evento a Diretora-Adjunta da Faculdade de Direito da UFRGS, Drª Tula Wesendonck; a Diretora Financeira do IARGS, Drª Maria Izabel de Freitas Beck; e a representante do presidente da Associação do Ministério Público do RS, Drª Maria Cristina Moreira de Oliveira.

A abertura do evento foi feita pela presidente do IARGS, Sulamita Santos Cabral, fazendo uma saudação a todos os presentes. Ela lembrou que, como ex-aluna da Universidade, estudou justo naquela sala o quinto ano do curso de Advocacia e que se sentia muito feliz em estar de volta representando o Instituto para um evento “de tamanha grandeza”.

Na sequência, o Dr. César Vergara de Almeida Martins Costa, coordenador geral do Núcleo, responsável pela organização e recepção ao palestrante Dr. Carlos Nejar, fez um agradecimento à Faculdade de Direito, nas pessoas da Diretora e vice-Diretora, Ana Paula Motta e Tula Wesendonck, que “gentilmente nos cederam este espaço sagrado que é o Pantheon, apoiando o IARGS desde o primeiro momento em que propusemos a realização dos encontros na Faculdade de Direito, e, também, à Presidente do IARGS por apoiar o evento.

Logo depois, fez um relato sobre a realizações de encontros históricos anteriores, que contaram com a presença de outros membros da Academia brasileira de Letras, recordando encontros com os Acadêmicos Cícero Sandroni, à época Presidente da Academia Brasileira de Letras, e Moacir Scliar, com quem teve a honra de debater a obra “O Mercador de Veneza” de Shakespeare.

Salientou a importância do primeiro encontro do ano de 2025, cujo palestrante, em suas palavras, é “o maior poeta brasileiro vivo”.

Ao final, sublinhou que a hipótese levantada pelos estudos teóricos do movimento do Direito e Literatura é, dentre outras a de que, por meio da Literatura, é possível compreender melhor os fatos da vida e exercitar a alteridade ao enxergar o outro que se apresenta na obra, aspecto que, segundo ele, é possibilitado na obra “Danações” de Carlos Nejar.

Faculdade de Direito da UFRGS

A Diretora da Faculdade de Direito da UFRGS, Ana Paula Motta, lembrou que a Faculdade, que está comemorando 125 anos de existência, é de todos. Disse que foi muito emocionante fazer a leitura do livro Danações, por realizar a junção entre a poesia e o “mundo do Direito”. Segundo ela, “existe uma junção de sentimentos quando nos reunimos para decidir sobre a vida de outros seres humanos”. E deu as boas-vindas ao “vivente” Carlos Nejar.

Carlos Nejar

Em sua palestra, Carlos Nejar lembrou, inicialmente, que, embora não tenha estudado nos bancos da Faculdade de Direito da UFRGS, sua filha sim. Logo, afirmou que sente que uma parte dele também tenha estudado lá.

Em sua obra "Danações" (1969), Nejar informou que utiliza o termo "danações" para explorar as condições humanas de sofrimento e condenação. O título reflete, de acordo com ele, sobre as adversidades e desafios enfrentados pelo ser humano.

Membro da Academia Brasileira de Letras, Carlos Nejar ressaltou a ligação entre direito e poesia, defendendo que o jurista deve ter humanidade e emoção no exercício da justiça. Ele destacou a importância da palavra na construção do direito e da literatura, afirmando que ambas lidam com a verdade, a transformação e o destino humano na busca por justiça.

Durante sua fala, Nejar leu trechos de alguns poemas de “Danações”, incluindo “O Julgador”, fazendo referência ao juízo, no qual reflete sobre a tensão entre réu e juiz, a incerteza dos processos e o peso das decisões jurídicas. Na oportunidade, também mencionou outros poemas, tanto de sua autoria quanto de autores clássicos. Ele fez referência a Caronte, o barqueiro da mitologia grega, presente em obras de Virgílio e Dante Alighieri. Além disso, recitou seu poema “O Juiz”, que aborda temas de julgamento e condição humana. Na mesma linha, declamou o poema mencionado foi "A Trama".

O poeta enfatizou a importância da linguagem na construção do direito, comparando o rigor do poema ao rigor dos códigos legais. Citando sua experiência como promotor de Justiça do RS, relembrou casos nos quais a fragilidade da prova o levou a absolver réus, demonstrando que a justiça, como a poesia, deve ser sensível e profunda.

Nejar também fez referências a sua trajetória literária, mencionando sua obra “A Terra dos Viventes”, e sua relação com a ancestralidade das palavras. Ele destacou a importância da metamorfose na poesia, diferenciando sua visão da de Kafka, ao afirmar que o ser humano tem possibilidades de mudança e crescimento.

Além disso, fez uma reflexão sobre a função do direito e da literatura na compreensão da existência e reiterou que a poesia e o direito devem caminhar juntos, “pois ambos lidam com a condição humana e a necessidade de justiça e transformação”

Dinéia Anziliero Dal Pizzol

De acordo com a advogada Dinéia Anziliero Dal Pizzol, a obra “Danações”, de Carlos Nejar, oferece uma reflexão profunda sobre os dilemas éticos e existenciais que permeiam a experiência humana, permitindo um diálogo surpreendente com os desafios da Inteligência Artificial. “Tal como Nejar destaca os conflitos e a resistência diante das adversidades sociais e existenciais, hoje somos confrontados com questões semelhantes perante o avanço da IA, especialmente em relação às decisões automatizadas e suas implicações jurídicas e éticas”, destacou Dinéia. Dessa forma, argumentou que a literatura convida a todos a refletir sobre a própria humanidade ao interagir com a tecnologia, auxiliando na preservação de valores essenciais em meio à crescente presença da inteligência artificial na vida de cada um.

Leonardo Garavelo

O Professor Doutor em Psicologia Social, Dr. Leonardo Garavelo iniciou sua intervenção compartilhando uma epígrafe do poema "Qualificação", presente na primeira edição do livro publicada pela Editora José Alves (1969): "O que sou sustenta o que não sou. Por mais grave a doença, a dor já me curou”. A partir dessa citação, Garavelo refletiu sobre a importância da escrita terapêutica, destacando sua experiência de quatro anos trabalhando com pacientes no Hospital Psiquiátrico São Pedro, em Porto Alegre.

Ele referiu a relevância do contexto histórico de 1969, período marcado pela Ditadura Militar no Brasil, para a compreensão da obra de Nejar. Observou que, apesar das adversidades políticas da época, os poemas abordam temas universais e atuais como a condição humana, a loucura, a liberdade e a ética.

Ao longo de sua análise, Garavelo estabeleceu conexões entre a obra de Nejar e conceitos da fenomenologia existencial, mencionando filósofos como Sartre e Heidegger. Para concluir, compartilhou um trecho de sua tese de doutorado, ressaltando que "a escrita reserva sempre também uma potência clínica, e essa potência clínica, que é da escrita, tem um efeito muito interessante de variações em nós mesmos”.

Final

Ao final do evento, o Dr. César Vergara de Almeira Martins Costa, homenageou, com um poema recente de sua autoria, o convidado Carlos Nejar. Dr. César informou que, ao trabalhar na edição de seu primeiro livro de poesia intitulado “Cega-Luz”, inspirou-se e escreveu o poema para ser apresentado no dia da realização do evento do Núcleo de Debates. O poema chama-se “O Poeta das Danações”:

O Poeta das Danações

Para o amigo Carlos Nejar



Caminha o menino pelos justos corredores

O vento aos seus pés provoca risos


Anda a passos leves de mãos dadas com Danae

Como a criança que chega à escola


Cruzam-lhe as denúncias

Ávidas fúrias querem conduzi-lo


Encontra defesas por vezes fortes, por vezes nuas

Mas o menino quer o carinho do vento


Tropeça nos julgamentos ouriços


Ergue-se pela palavra

Pela palavra canta


Na palavra se espanta

Vê no átrio os velhos rebuliços


O menino agora é monumento

Vivo monumento de poesia atravessado pelo vento


O mesmo monumento que tem força de busto

Intacto, heroico, viu tudo nos corredores e escaninhos

Epopeia em versos de um busto que caminha, que segue encantando pássaros


É o poeta togado

A palavra sempre o procura

A toga ainda o persegue

É quem julga e é julgado


Moldado pelos apertos de mão de Danae

Fecundou-se em chuva

Já não tem os pés atados, mas as mãos não livram

das danações causadas pelo Tribunal da vida


Encontra sempre a palavra

Crê no impossível

Colhe os frutos do trabalho que o consumiu ao avesso

Sua morada é a morada dos ventos

Sua alma cadenciada pelas marés a outra maré sempre regressa


Para finalizar o evento, a Drª Sulamita Santos Cabral descreveu como memorável o debate sobre “Danações” e disse que estava orgulhosa por ter feito parte. “Estou maravilhada”, concluiu.

Logo depois, o Dr. César Vergara de Almeida Martins Costa ofereceu uma rosa às integrantes da Mesa e à jornalista Terezinha Tarcitano, em referência ao mês da mulher.

O evento teve o apoio da Faculdade de Direito da UFGRS, da Academia Brasileira de Letras e foi patrocinado pelo escritório Vergara Martins Costa, Troglio e Sanvicente Advogados.

Terezinha Tarcitano
Assessora de Imprensa


Drª Sulamita Santos Cabral

Dr. César Vergara de Almeida Martins Costa

Drª Ana Paula Motta

Poeta Carlos Nejar





Drª Dinéia Anziliero Dal Pizzol

Dr. Leonardo Garavelo




Entrega das rosas



Fotos: Wanderlei Oliveira

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