Com a palestra “O Novo CPC e a advocacia de família: mudança de paradigmas”, o presidente do IBDFAM, Conrado Paulino da Rosa, compareceu hoje, dia 26/04, ao IARGS, no Grupo de Estudos de Direito de Família.
Na avaliação do advogado, embora vivamos numa sociedade contemporânea, com grande facilidade de comunicação, nunca, em nenhum outro momento histórico, houve tanta dificuldade em dialogar. Adverte que, com a falta da implementação de uma cultura de pacificação, a gestão dos conflitos familiares tornou-se um catalizador de novos litígios, com a substituição do vínculo conjugal pelo vínculo processual, propiciando imensuráveis perdas (financeiras, temporais e psicológicas) nas Varas de Família. Todavia, salientou que o ano de 2016 passou a ser um marco nessa história frente a vigência do novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015) e da Lei da Mediação (13.140/2015).
Ressaltou que a prática da mediação tornou-se um espaço fértil no tratamento dos conflitos familiares com o auxílio dos profissionais das áreas do Direito, da Psicologia e do Serviço Social nesse ofício. Na Justiça, afirmou, deságuam as carências das áreas da saúde e social, mas, principalmente, o sofrimento da alma humana, quando o litígio envolve questões ligadas ao Direito de Família. Nesse sentido, considera que o amor tem a potencialidade de demonstrarmos o que temos de melhor, mas também, uma vez frustrados e machucados, esse sentimento pode trazer à tona nossas piores características até então não reveladas.
Conforme explicou, as disputas familiares, por definição, envolvem relacionamentos que precisam perdurar. “A síndrome do perde-ganha dos tribunais provoca um verdadeiro desastre em uma família que se desfaz”, acentuou, acrescentando que uma das provas de ineficiência do sistema contencioso é o ajuizamento de inúmeras e sucessivas ações judiciais envolvendo a mesma entidade familiar, quando sua dissolução não tiver, como norte, meios que verdadeiramente possam terminar com o conflito.
Destacou que, em grande parte dos processos judiciais que envolvem questões de família, o vínculo do ódio, da vingança e da perseguição pode arrastar-se durante anos, dificultando a ambos os parceiros o refazer da vida em outras direções. “Substituem a vinculação conjugal por um vínculo processual afetivo, cujas possibilidades de conflitos a se abrirem no âmbito da família são múltiplas, para regozijo dos(as) viúvos(as) do vínculo, o que acaba por oferecer um farto manancial para o exercício da belicosidade”, observou.
No final dessa verdadeira via crucis, caso um dos cônjuges ou companheiros não tenha alguma decisão judicial a seu favor, poderá recorrer da sentença a uma instância superior, “onde se realizará outra justiça a seu favor”. Para o advogado, por trás de toda petição, há sempre uma repetição de uma demanda originária, que é de amor. Acentuou que a dor gerada nos filhos do casal que se separa não traduz apenas um sofrimento momentâneo, mas tem a possibilidade de provocar prejuízos emocionais que podem se estender por toda a vida.
Na avalição do Dr Conrado, a única forma de possibilitar o atendimento de tal princípio é com a adoção da mediação, mostrando-se como um dever dos profissionais do Direito, da Psicologia e do Serviço Social, que laboram nos litígios familiares, a adoção dessa prática, para a construção de novas alternativas aos atores da vida familiar.
“A mediação é um processo que pode dar uma importante contribuição para a resolução pacífica das disputas. Surge, assim, como alternativa, substituindo o modelo conflitual apresentado pelo Poder Judiciário com o auxílio de um contexto autônomo em relação ao procedimento judiciário, tende a garantir alguma (re)organização das relações”, destacou.
Segundo ele, os mediandos não atuam como adversários, mas como co-responsáveis pela solução da disputa, contando com a colaboração do mediador. “Essa proposta representa uma autocomposição assistida ou terceirizada, uma vez que são os próprios sujeitos em conflito que discutirão e comporão as controvérsias”, afirmou.
“A substituição do paradigma bélico (resolução do conflito através de batalhas das quais um sairá vencedor e outro, vencido) pelo paradigma da cooperação, por meio da trégua, faz-se necessária para que se possa levar os sujeitos em conflito a atuar pela busca da mudança, do crescimento e da evolução das relações. Cabe-nos, sim, ajudá-los a abrir clareiras, ao invés de trincheiras, a buscar tréguas, ao invés de incentivar batalhas ou guerrilhas, para que os auxiliemos a serem capazes de cooperar, individualmente, para a realização do todo”, avaliou.
E completou: “o que se almeja no procedimento mediativo é uma postura de responsabilidade pelo projeto de futuro que vai nortear a vida daquelas pessoas vinculadas por relações de afeto e familiares. Isso significa, proporcionar às famílias a oportunidade de uma comunicação destinada a esclarecer mal-entendidos, com vistas a evitar rupturas desnecessárias e diminuindo o desgaste e sofrimento”.
No entendimento do especialista, a separação de um casal não significa tratar apenas do patrimônio no sentido específico do termo, mas sim trabalhar as perdas emocionais, os lutos afetivos pela morte de um projeto a dois, os sonhos acalentados e não realizados, ou seja, por tudo aquilo que cada indivíduo depositou em seu parceiro.
Novo Código
Dr Conrado Paulino citou que a vigência do novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015) e da Lei da Mediação (13.140/2015) apresenta um marco divisor na prática profissional ao implementar, de modo claro e por uma proposta definitiva, métodos consensuais de tratamento de conflitos como a regra, deixando a intervenção impositiva para a via residual.
Nas ações de família, conforme estabelece o artigo 694 do novo CPC, referiu que todos os esforços serão empreendidos para a solução consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxílio de profissionais de outras áreas de conhecimento para a mediação e conciliação. Outra novidade citada refere-se ao requerimento das partes: o juiz pode determinar a suspensão do processo enquanto os litigantes se submetem a mediação extrajudicial ou a atendimento multidisciplinar (parágrafo único do artigo 694 do novo CPC). Lembrou que a mediação judicial (judiciária gratuita) não exclui a mediação privada.
Informou que as sessões de mediação poderão se dividir em tantas sessões quantas forem necessárias para viabilizar a solução consensual, sem prejuízo de providências jurisdicionais, para evitar o perecimento do direito (artigo 696 do novo CPC). Contudo, advertiu que não pode haver espaço de mais de dois meses entre uma mediação e outra.
Além disso, informou que o conciliador, de acordo com o artigo 165 § 2o do novo CPC, atuará, preferencialmente, nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes. Comunicou que o profissional, em seu ofício, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.
Por sua vez, disse, o mediador, conforme estabelece o artigo 165 § 3o do novo CPC, atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre os sujeitos, de modo a auxiliar os interessados a compreender as questões e os interesses em conflito. “A ideia é a de que o mediador possa agir como colaborador para que os participantes da mediação possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos”, enfatizou.
No entendimento do advogado, é recomendável a participação de dois profissionais, sendo que um deles funcione enquanto mediador e o outro como comediador. Dessa forma, recomenda, pela prática da mediação, que a dupla de profissionais possua formação distinta, ou seja, um(a) advogado(a) e um(a) assistente social, um(a) psicólog(a) e um(a) advogado(a), por exemplo. “A utilização da comediação possibilita uma efetiva troca de saberes entre as diferentes áreas de conhecimento”, avisou.
A Lei da Mediação (13.140/2014) também destacou tal possibilidade, uma vez que, a requerimento das partes ou do mediador, como estabelece o artigo 15, poderão ser admitidos outros mediadores para colaborarem no mesmo procedimento, quando isso for recomendável, em razão da natureza e da complexidade do conflito.
No art. 334, §5º do CPC falou que não se permite às partes renunciar à realização da audiência de mediação e conciliação: “A intenção é clara: fazer com que as partes tenham contato com o mediador, de modo a arrefecer os ânimos e perceber as vantagens da solução consensual”.
E, bem por conta dessa obrigatoriedade, de acordo com o §8º do art. 334 do Código, a ausência da parte à audiência obrigatória pode ser sancionada com a aplicação de multa. “Pensar diferentemente é o mesmo que esvaziar a obrigatoriedade da audiência de mediação e conciliação, uma vez que a ausência da parte não produziria qualquer efeito”, frisou.
Enfatizou que, tradicionalmente, não é incentivada nos bancos de cursos de Direito uma educação para a paz e para o cuidado com os sentimentos. Para o Dr Conrado, o que se busca na contemporaneidade é o deslocamento do trabalho multidisciplinar para um trabalho que se quer interdisciplinar, reconhecendo, nas diversas áreas do conhecimento. “Enquanto no primeiro os profissionais atuam de forma isolada, no último o trabalho é realizado de forma conjunta, com as ciências trabalhando lado a lado”, evidenciou,
Considera que a efetivação de tal metodologia depende de uma mudança de comportamento de cada um dos profissionais que auxiliem os envolvidos na dissolução afetiva. “Advogados, membros do Ministério Público, magistrados, assistentes sociais e psicólogos que atuam em processos na área de família são conhecedores que as carências dos integrantes do relacionamento conjugal e parental não são necessidades jurídicas, mas sim, de cuidado, atenção e, acima de tudo, uma necessidade de escuta para as dores que não são físicas mas, na verdade, do coração”, sublinhou.
“A partir dessa inovadora visão que tem como proposta a mediação de conflitos, construiremos, por certo, uma Justiça mais humana, próxima do cidadão e, também, construindo um espaço de autonomia e resgate da cidadania. Da trama ao desenlace, os atores da vida familiar irão se sentir como verdadeiros protagonistas de suas história, nas quais todos comungam (ou devem comungar) da mesma vontade: serem felizes para sempre”, concluiu.
Terezinha Tarcitano
Assessora de Imprensa