1. Breve contextualização do Tema
A
finitude dos relacionamentos afetivos vem acompanhada de uma série de
desdobramentos jurídicos. A guarda dos filhos, a regulamentação da convivência
familiar e o direito a alimentos encerram questões mais sensíveis, a clamar por
uma Justiça iminente e efetiva. E não poderia ser diferente, dada a
peculiaridade dos valores tutelados. Não por outra razão, o diploma processual
civil expressamente antevê a possibilidade de concessão de tutela provisória
nas ações de família antes mesmo da citação do réu.
A
partilha de bens, por sua vez, conquanto usualmente integre o rol de pedidos
cumulados às ações de divórcio e declaratórias de união estável, por vezes acaba,
ou sendo relegada, ou tumultuada por um dos consortes em flagrante abuso de
direito, gerando no mínimo a um dos titulares um alijamento demasiadamente
prolongado do patrimônio que lhe pertence por força do regime de bens eleito.
Diante
deste cenário, é preciso direcionar o uso dos mecanismos jurídicos existentes,
não só para amenizar o prejuízo resultante do tempo do processo, mas igualmente
agilizar a resolução das questões de ordem patrimonial e evitar a fraude à
partilha.
2.
A tutela de urgência
O art. 300 do Código de
Processo Civil prevê os mesmos requisitos
legais, tanto para a tutela de urgência cautelar quanto para a antecipada, qual
sejam, a probabilidade do direito (fumus
boni iuris) e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora). A unificação do
tratamento levada a efeito pelo diploma processual civil trouxe maior
facilidade aos operadores do direito, em contrapartida às diferenças
técnico-conceituais do código anterior.
Outrossim, toda e
qualquer providência capaz de alcançar um resultado prático à parte pode ser
antecipada. Da mesma forma, toda e qualquer tutela idônea para a conservação do
direito pode ser requerida pela parte a título de tutela cautelar. Isso
significa que o pedido de tutela de urgência – satisfativo ou cautelar – é
atípico, não estando limitado à proteção de apenas determinadas situações
substanciais, face à necessidade de se oferecer uma cobertura o mais completa
possível às situações concretas carentes de proteção.
É bastante comum o uso de
tutela de urgência cautelar em ações de partilha de bens, principalmente quando
um dos consortes objetiva o esvaziamento do direito de meação do outro,
utilizando-se para tanto de atos fraudulentos. Com efeito, não raro o cônjuge
administrador subtrai bens da massa comunicável, por intermédio de
transferências fictícias ou através de aparentes alienações respaldadas por
esquecidas procurações, isso quando não sucedidas pelo uso de interposta pessoa
física ou jurídica.
Ao cônjuge ou companheiro
lesado, não resta outra alternativa senão a tomada de medidas jurídicas
cabíveis aptas a salvaguardar seu patrimônio. O ônus da prova é de quem requer
a tutela de urgência, de maneira que é preciso comprovar a existência de
indícios de ocultação de bens ou de dilapidação patrimonial a fim de obter a
cautela pleiteada.
Nessa linha, convém
ressaltar que na alienação de bens por pessoa que vivem em união estável e têm
o imóvel registrado apenas em seu nome, o negócio jurídico pode transcorrer sem
maiores dificuldades ante a ausência de informação acerca da existência do
companheiro a exigir sua anuência. Nessa hipótese, a medida mais eficaz é a
averbação da proibição de alienação do bem na respectiva matrícula imobiliária. Trata-se de medida
expressamente prevista no artigo 301 do diploma processual civil, cujo rol é meramente
exemplificativo.
De outro lado, caso
esteja averbada na matrícula do imóvel a escritura pública de união estável ou
decisão declaratória da existência de união estável, ao terceiro adquirente
surge a obrigação de exigir o consentimento do companheiro, aplicando-se
igualmente a norma prevista para os cônjuges, contida no art. 1.647, I, do Código Civil, conforme
já decidiu o Superior Tribunal de Justiça.
Como se vê, em se
tratando de patrimônio imobiliário, os atos de disposição patrimonial sem o
consentimento do companheiro podem ser dificultados na união estável. Ainda
assim, tal como ocorre no casamento, não é incomum a venda de imóveis e desvio
por quem se encontra na administração dos bens, ainda na constância do
relacionamento, ante a presença dos primeiros sinais do arrefecimento do
vínculo, utilizando-se da boa-fé do outro e da presença de interpostas pessoas
físicas, que podem estar de boa-fé ou não, circunstância irrelevante para fins
da caracterização de fraude.
Diante deste cenário, em
que o esvaziamento da meação se dá na vigência do relacionamento, torna-se
ainda mais difícil ao cônjuge ou companheiro prejudicado a tarefa de comprovar
a fraude operada e de obter o deferimento de medidas acautelatórias - como a
proibição de venda e o bloqueio de valores depositados em instituições
financeiras -, a fim de salvaguardar o que restou do patrimônio.
É igualmente frequente a
utilização de pessoas jurídicas para desviar os bens comuns. Valendo-se da
estrutura de uma sociedade já existente ou de uma empresa especialmente criada
para esta finalidade, o patrimônio é repassado para a titularidade da empresa
ou já é registrado diretamente em seu nome, com o objetivo de fraudar a meação
ou o crédito do consorte através do uso abusivo da personalidade judiciária.
Para que o patrimônio
comum acobertado pelo nome da pessoa jurídica integre a partilha dos bens, faz-se
necessária a instauração de incidente de desconsideração da personalidade
jurídica, com fundamento no artigo 50 do Código Civil e artigos 133 a 137 do
Código de Processo Civil. Na seara do direito das famílias, ocorre a desconsideração
inversa da personalidade jurídica, para permitir sejam
atingidos todos os bens postos ao abrigo da sociedade empresarial. A sociedade
empresária não perde a sua personalidade jurídica, mas tão somente o inquinado
de abusivo é desconsiderado, declarando-se sua
ineficácia em relação ao cônjuge ou companheiro prejudicado, nos termos do art.
137 do diploma processual civil.
Todavia, até que o ato
seja declarado ineficaz pelo poder judiciário, inúmeras são as manobras
possíveis para que a tentativa de frustrar o direito de meação do consorte seja
concretizada. Endividamentos, esvaziamento do patrimônio societário, fechamento
da empresa etc. são alguns exemplos vivenciados na prática, os quais indicam a
operação de atos suspeitos e que podem causar danos patrimoniais irreversíveis,
ensejando, portanto, o uso das tutelas de urgência nesse incidente processual, como a proibição de
alienação de quotas sociais e o arrolamento de bens da empresa.
Sobressaindo nítido que o
bem registrado em nome da empresa era de uso exclusivo da família, a exemplo de sítios e
casas de lazer ou veraneio, de todo viável estender o direito de posse também ao
cônjuge ou companheiro preterido sobre esses imóveis, a título de antecipação
dos efeitos da tutela.
Relativamente à posse
sobre bens ainda não partilhados, não é demais ressaltar a possibilidade de
fixação de alimentos compensatórios, que tem por finalidade recompor o
equilíbrio financeiro entre as partes quando
apenas um deles se encontra na posse e administração do patrimônio rentável. Nessa mesma linha, o uso
exclusivo de imóvel comum por apenas um dos consortes gera ao outro o direito
de obter uma indenização, incidindo a regra de que os frutos de bens comuns
pertencem a ambos e da vedação do
enriquecimento sem causa. Com efeito, uma vez
comprovado que o patrimônio é comum, bem como que vem sendo exclusiva e
gratuitamente usufruído pelo outro consorte não é apenas admissível, mas
necessário o arbitramento de um valor a título de remuneração àquele que se
encontra afastado de seu patrimônio.
Trata-se de entendimento
atualmente consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, após anos de divergência
jurisprudencial. Todavia, não se enquadra propriamente como tutela de urgência
em sede de partilha de bens, e sim como um direito decorrente da posse
exclusiva apta a configurar o enriquecimento injustificado ou o abuso de
direito.
3.
A tutela da evidência
A tutela da evidência
exige a plausibilidade do direito invocado, da mesma forma que a tutela de
urgência, mas prescinde da “demonstração do perigo de dano ou de risco ao
resultado útil do processo”, não podendo ser com ela confundida (CPC, artigo 311).
Trata-se de técnica
processual destinada a viabilizar a distribuição do ônus do tempo no processo, haja
vista o compromisso assumido pelo Estado de tutelar de forma pronta e efetiva
os direitos, além de conferir tratamento isonômico às partes. A distribuição do
ônus do tempo no procedimento comum é imprescindível para a democratização no
processo civil, pois evita que o tempo seja tratado de forma diferenciada
apenas diante dos procedimentos especiais, que, como o próprio nome indica,
preocupam-se apenas com situações especiais, esquecendo-se que a questão da
distribuição do tempo é vital diante de toda
e qualquer situação litigiosa concreta.
Nas ações de partilha de
bens, a questão do tempo do processo é ponto que merece especial atenção.
Em que pese a
aplicabilidade do rito do inventário à partilha de bens (CPC, 731, parágrafo
único), como esse procedimento
não comporta questão de alta indagação, na prática ocorre a ordinarização do
rito por conta das discussões travadas no processo quanto à comunicabilidade ou
incomunicabilidade de determinados bens, as quais serão solvidas por ocasião da
sentença quando ocorrerá a delimitação do acervo comum alvo de partição. E não
raro ainda sobram pontos a serem relegados para a fase de liquidação de
sentença. O caminho, portanto, é muito longo até que finalmente seja ultimada a
partilha dos bens.
De outro lado, como
referido inicialmente, a cumulação de ações levada a efeito nos divórcios e ações
declaratórias de união estável faz com que as discussões mais sensíveis – e não
raro demasiadamente litigiosas – envolvendo a guarda dos filhos, convivência,
alienação parental, alimentos, assumam o protagonismo do andamento processual.
Enquanto isso, as partes permanecem com as questões patrimoniais sub judice por anos, premidas do pleno
exercício do direito de propriedade sobre seus bens.
Para aqueles que se
encontram na posse da maior parte do patrimônio, a postergação do término da
partilha é conveniente. E não bastasse a morosidade inerente por todos os
motivos referidos, não economizam esforços para travar discussões
inconsistentes, requerer perícias desnecessárias, enfim, tumultuar o andamento
processual como um todo.
Nessa linha, diante do
exposto no inciso I do artigo 311 do Código de Processo Civil, a tutela da
evidência pode servir como um meio de antecipação da posse e da fruição de
determinados bens, de forma a equilibrar entre os consortes o exercício dos
poderes inerentes à propriedade, e até mesmo como
fundamento para se antecipar pedidos de meação.
Com efeito, por força da
aplicabilidade do rito do inventário às partilhas decorrentes de divórcio e
união estável, forçoso reconhecer a incidência da tutela de evidência prevista
no artigo 647 do Código de Processo Civil, a qual expressamente
autoriza a antecipação e fruição dos bens que compõem o acervo patrimonial.
Sobre o tema, oportuno
citar julgado do Superior Tribunal de Justiça em que admitida a antecipação do
uso e fruição dos bens inventariados tanto por tutela provisória de evidência, como
de urgência, desde que preenchidos os pressupostos legais:
A antecipação da fruição e do uso
de bens que compõem a herança é admissível: (i) por tutela provisória da
evidência, se não houver controvérsia ou oposição dos demais herdeiros quanto
ao uso, fruição e provável destino do referido bem a quem pleiteia a
antecipação; (ii) por tutela provisória de urgência, independentemente de
eventual controvérsia ou oposição dos demais herdeiros, se presentes os
pressupostos legais.
Quando existente nos
autos elementos de prova suficientes a comprovar o direito alegado, ao qual a
outra parte não possa opor prova em contrário, é perfeitamente possível a concessão da tutela da evidência (CPC,
art. 311, IV).
Exemplo prático de aplicabilidade desse dispositivo legal é quando a parte
alega a existência de sub-rogação de bens, com o objetivo de excluir
determinado bem da partilha por ser total ou parcialmente incomunicável. Não
raro sobrevêm alegações notadamente infundadas ou cabalmente comprovadas, mas
que culminam por manter o patrimônio sub
judice e, por conseguinte, privando o titular do pleno exercício do seu
direito de propriedade no mínimo até a prolação de sentença, senão até o
trânsito em julgado da decisão.
Destarte, a depender da
robustez dos elementos de convicção aportados aos autos, forçoso reconhecer à
parte cuja prova milita o direito de propriedade a posse sobre o bem, a fim de
que o use com exclusividade sem qualquer ônus.
4. Conclusão
As tutelas de urgência e
de evidência consolidam a necessidade de se tutelar o direito material de
maneira célere e eficaz, em consonância com os valores constitucionais da
inafastabilidade do poder judiciário e da duração razoável do processo (CF,
art. 5º, LXXVIII, XXXV; CPC, arts. 3 e 4).
Conquanto direitos de
natureza extrapatrimonial constituam, sem sombra de dúvidas, um terreno fértil
para a aplicação das tutelas de natureza provisória, à partilha de bens não vêm
sendo aplicadas estas técnicas de maneira profícua. O resultado são processos
morosos, onerosos e que deixam os jurisdicionados à mercê do tempo e/ou da
má-fé de quem detém a posse da maior fatia do patrimônio.
O rompimento dos vínculos
afetivos não pode ser sinônimo de alijamento patrimonial, mas é o que acontece
na prática, na contramão do direito de propriedade e da própria natureza da
ação de partilha, que resumidamente tem o condão de repartir o patrimônio que
era comum em patrimônio individual.
Se de um lado é possível
lançar mão de medidas de urgência de há muito aplicadas, de outro a atipicidade
das tutelas provisórias proporciona um vasto campo para a inovação, cabendo aos
operadores do direito a tarefa de trazer uma feição mais dinâmica e justa ao
processo de partilha de bens.
CPC. Art. 695. Recebida a petição inicial e, se for o
caso, tomadas as providências referentes à tutela provisória, o juiz ordenará a
citação do réu para comparecer à audiência de mediação e conciliação, observado
o disposto no art. 694.
AGRAVO
INTERNO. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO
ESTÁVEL. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE MANTEVE A DECRETAÇÃO DE INDISPONIBILIDADE DE
IMÓVEIS REGISTRADOS EM NOME DO RÉU. PRETENSÃO RECURSAL DE REFORMA.
DESCABIMENTO, NA HIPÓTESE.1. NOS TERMOS DA ITERATIVA JURISPRUDÊNCIA DESTA
CORTE, É POSSÍVEL DECRETAR-SE A INDISPONIBILIDADE DE BENS PARA GARANTIR
FUTURA PARTILHA, AINDA QUE PENDA CONTROVÉRSIA ACERCA DA
EXISTÊNCIA DA UNIÃO ESTÁVEL.2. À UNIÃO ESTÁVEL APLICA-SE O REGIME DA COMUNHÃO
PARCIAL DE BENS, PELO QUAL SE COMUNICAM OS BENS ADQUIRIDOS ONEROSAMENTE EM SUA
CONSTÂNCIA.3. É DE QUEM ALEGA O ÔNUS DE MOSTRAR QUE A SITUAÇÃO REGISTRAL DOS
BENS NÃO ESPELHA A REALIDADE. NA AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA E
DEMONSTRAÇÃO CABAL DE CIRCUNSTÂNCIA EXCLUDENTE, A COMUNICABILIDADE É
PRESUMIDA.4. JUSTIFICA-SE A DECRETAÇÃO DE CONSTRIÇÃO CAUTELAR DOS
AQUESTOS QUANDO HÁ INDÍCIOS DE QUE O PATRIMÔNIO PODE SER DILAPIDADO,
NOTADAMENTE A REALIZAÇÃO DE ONZE NEGÓCIOS JURÍDICOS IMOBILIÁRIOS NO MESMO DIA E
COM A MESMA PESSOA, APÓS O TÉRMINO DA SOCIEDADE CONJUGAL ALEGADAMENTE HAVIDA
ENTRE AS PARTES E EM DATA PRÓXIMA AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO, DEPOIS DE TER RESTADO
FRUSTRADA A TENTATIVA DE AUTOCOMPOSIÇÃO EXTRAJUDICIAL.AGRAVO INTERNO
DESPROVIDO. (TJRS, AI 50736014620208217000, Sétima Câmara Cível, Relator: Vera
Lucia Deboni, j. em: 23-06-2021)
RECURSO
ESPECIAL. DIREITO PATRIMONIAL DE FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL. ALIENAÇÃO DE BEM IMÓVEL
ADQUIRIDO NA CONSTÂNCIA DA UNIÃO. NECESSIDADE DE CONSENTIMENTO DO COMPANHEIRO.
EFEITOS SOBRE O NEGÓCIO CELEBRADO COM TERCEIRO DE BOA-FÉ.
1.
A necessidade de autorização de ambos os companheiros para a validade da
alienação de bens imóveis adquiridos no curso da união estável é consectário do
regime da comunhão parcial de bens, estendido à união estável pelo art. 1.725
do CCB, além do reconhecimento da existência de condomínio natural entre os
conviventes sobre os bens adquiridos na constância da união, na forma do art.
5º da Lei 9.278/96, Precedente.
2.
Reconhecimento da incidência da regra do art. 1.647, I, do CCB sobre as uniões
estáveis, adequando-se, todavia, os efeitos do seu desrespeito às nuanças
próprias da ausência de exigências formais para a constituição dessa entidade
familiar.
3.
Necessidade de preservação dos efeitos, em nome da segurança jurídica, dos atos
jurídicos praticados de boa-fé, que é presumida em nosso sistema jurídico.
4.
A invalidação da alienação de imóvel comum, realizada sem o consentimento do
companheiro, dependerá da publicidade conferida a união estável mediante a
averbação de contrato de convivência ou da decisão declaratória da existência
união estável no Ofício do Registro de Imóveis em que cadastrados os bens
comuns, ou pela demonstração de má-fé do adquirente.
5.
Hipótese dos autos em que não há qualquer registro no álbum imobiliário em que
inscrito o imóvel objeto de alienação em relação a co-propriedade ou mesmo à
existência de união estável, devendo-se preservar os interesses do adquirente
de boa-fé, conforme reconhecido pelas instâncias de origem.
6.
RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (STJ, 3ª. Turma, REsp 1424275/MT, j.
em 4.12.2014, Dje 16.12.2014)
DISSOLUÇÃO DE
UNIÃO ESTÁVEL/DIVÓRCIO. BLOQUEIO DE VALORES EXISTENTES EM CONTA E APLICAÇÕES EM
NOME DO RÉU. TUTELA PROVISÓRIA. CABIMENTO. 1. A ANTECIPAÇÃO
DE TUTELA, RECEPCIONADA PELOS ARTS. 294 A 311 DO CPC, COMO TUTELA PROVISÓRIA
(DE URGÊNCIA E DE EVIDÊNCIA) CONSISTE NA CONCESSÃO IMEDIATA
DA TUTELA RECLAMADA NA PETIÇÃO INICIAL, MAS SUA CONCESSÃO
PRESSUPÕE EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS QUE EVIDENCIEM A PROBABILIDADE DO DIREITO
RECLAMADO PELO AUTOR E, AINDA ASSIM, SE HOUVER PERIGO DE DANO OU O RISCO AO
RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO, CONSOANTE ESTABELECE CLARAMENTE O ART. 300 DO CPC,
OU AINDA, NA AUSÊNCIA DE TAIS ELEMENTOS, FICAR CARACTERIZADA ALGUMA DAS
HIPÓTESES DO ART. 311 DO CPC. 2. SENDO INCONTROVERSO QUE AS PARTES MANTIVERAM
VIDA MARITAL POR QUASE TREZE ANOS, ADOTANDO O REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL
DE BENS, E TENDO EM MIRA QUE O VARÃO PROVIDENCIOU A TRANSFERÊNCIA
DE VALOR EXPRESSIVO QUE ESTAVA DEPOSITADO EM CONTA CONJUNTA DO CASAL PARA CONTA
DE SUA EXCLUSIVA TITULARIDADE, APÓS A SEPARAÇÃO FÁTICA, CORRETA A CAUTELA
ADOTADA PELO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU, DE DETERMINAR O BLOQUEIO DE METADE DO
MONTANTE, A FIM DE ASSEGURAR EVENTUAL FUTURA PARTILHA. RECURSO
DESPROVIDO. (TJRS, AI 50539754120208217000, 7ªCC, Rel: Sérgio Fernando de
Vasconcellos Chaves, j. em: 24-03-2021)
CC. Art. 50. Em caso de abuso da
personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela
confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério
Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os
efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos
bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica
beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.
RECURSO
ESPECIAL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEFICÁCIA E DESCONSIDERAÇÃO
INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA C/C PARTILHA DE BENS. INÉPCIA DA INICIAL.
INEXISTÊNCIA. CAUSA DE PEDIR. TRANSMISSSÃO FRAUDULENTA DE QUOTAS SOCIAIS POR
EX-COMPANHEIRO. TENTATIVA DE SONEGAR BENS DA MEAÇÃO. PEDIDO DE DESCONSIDERAÇÃO
INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA DAS EMPRESAS. POSSIBILIDADE. DECADÊNCIA DO
DIREITO. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PEDIDO DECLARATÓRIO DE NULIDADE POR FRAUDE.
AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1.
O acórdão do Tribunal de origem, analisando os elementos fático-probatórios dos
autos, assentou que a causa de pedir seria a transferência, pelo réu, de quotas
sociais a terceiros, mantendo-se, todavia, no comando das referidas empresas,
com intuito de esvaziar patrimônio, não se sujeitar ao regime de bens da união
estável e burlar eventual partilha. Daí decorreu, segundo a Corte Estadual o
pedido da necessária desconsideração inversa da personalidade jurídica das
empresas para se declarar a ineficácia da transferência em relação à autora.
2.
O posicionamento do Tribunal de origem está em harmonia com o entendimento
consolidado em julgados desta Corte Superior que, acerca da temática,
entenderam, em situações análogas à deste processo (união estável), ser
"possível a desconsideração inversa da personalidade jurídica sempre que o
cônjuge ou companheiro empresário valer-se de pessoa jurídica por ele
controlada, ou de interposta pessoa física, a fim de subtrair do outro cônjuge
ou companheiro direitos oriundos da sociedade afetiva".
3.
"A jurisprudência desta Corte admite a aplicação da desconsideração
inversa da personalidade jurídica toda vez que um dos cônjuges ou companheiros
utilizar-se da sociedade empresária que detém controle, ou de interposta pessoa
física, com a intenção de retirar do outro consorte ou companheiro direitos
provenientes da relação conjugal." (REsp 1522142/PR, Rel. Ministro MARCO
AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/06/2017, DJe 22/06/2017) 4. A
petição inicial não é inepta quando da narração dos fatos decorre logicamente o
pedido.
5.
O acórdão recorrido assentou que a pretensão da autora foi de desconsideração
inversa da personalidade jurídica, não constando dos autos "pedido
declaratório de nulidade de negócio jurídico por fraude, caso em que caberia a
ação pauliana ou revocatória e se aplicaria, então, o prazo decadencial de 4
(quatro) anos" 6. "Correspondendo a direito potestativo, sujeito a
prazo decadencial, para cujo exercício a lei não previu prazo especial,
prevalece a regra geral da inesgotabilidade ou da perpetuidade, segundo a qual
os direitos não se extinguem pelo não-uso. Assim, à míngua de previsão legal, o
pedido de desconsideração da personalidade jurídica, quando preenchidos os
requisitos da medida, poderá ser realizado a qualquer tempo." (REsp
1312591/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em
11/06/2013, DJe 01/07/2013) 7. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ, AgInt
no AREsp 1243409/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, 4ª T, j. em 08/06/2020,
DJe 12/06/2020)
AGRAVO DE
INSTRUMENTO. INCIDENTE DE. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. CONFUSÃO
PATRIMONIAL PARCIAL. 1. A desconsideração da personalidade jurídica inversa, (disregard doctrine)
é medida extrema aplicável em caso de abuso da personalidade jurídica
caracterizado pelo desvio de finalidade, confusão patrimonial ou inadimplemento
e falta de bens para responder por obrigações. 2. Ficando
comprovado que, durante a união estável, o varão adquiriu vários bens em
nome da empresa da qual é sócio majoritário, para uso ostensivo da família, é
evidente a confusão patrimonial que autoriza a aplicação da disregard doctrine,
isto é, a desconsideração da personalidade jurídica, com a consequente inclusão
de tais bens na partilha. 3. Não é possível
incluir na partilha bens imóveis adquiridos pela
empresa, e locados por ela, pois, apesar de a locação de bens não
constar do seu objeto social, a pessoa jurídica pode aplicar recursos em bens imóveis,
que, inclusive, poderão servir de lastro para futuros contratos e operações,
impulsionando a atividade empresarial, sendo que, em relação a esses bens,
o direito de meação da autora se restringe à proporção das quotas sociais a
cujo valor ela faz jus. 4. Descabe a aplicação do disposto no art. 50 do CCB,
quando não há comprovação cabal da confusão patrimonial ou do desvio de
finalidade. Recurso provido em parte.(TJRS, AI 70084527571, 7ªCC, Rel: Sérgio
Fernando de Vasconcellos Chaves, j. em: 24-03-2021)
AGRAVO
DE INSTRUMENTO. FAMÍLIA. AÇÃO DE DIVÓRCIO, ALIMENTOS E PARTILHA DE BENS.
PRETENSÃO DE MANUTENÇÃO NA POSSE DE BEM COMUM. MANCOMUNHÃO. USO EXCLUSIVO DO
PATRIMÔNIO COMUM. TUTELA DE EVIDÊNCIA. Não merece
reforma a decisão que deferiu pedido de desocupação de imóvel para uso da
divorcianda, sob pena de desocupação compulsória, uma vez que se trata de bem
arrolado na ação de divórcio e cuja comunicabilidade é incontroversa.
Permanecendo o patrimônio em estado de mancomunhão, não se afigura equânime que
apenas uma das partes usufrua de todos os bens. Caso concreto
em que o processo, apesar de ajuizado há mais de seis anos, ainda não chegou a
termo, apesar das tentativas de composição amigável do litígio pela parte
agravada, sendo cabível, em razão disso, a concessão da antecipação de tutela com
fulcro na evidência do direito, nos termos do artigo 311,
inciso I, do Código de Processo Civil. Agravo desprovido. (TJRS, AI
70083445361, 7ª CC, Rel.: Afif Jorge Simões Neto, Julgado em: 28-04-2020)